quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Energia

 

   Um tema que está sendo muito comentado tanto no meio espiritualista e científico é a questão da Energia. Sobre o tema, transcrevo aqui alguns parágrafos de um livro onde a autora desenvolve a partir tanto da visão do filósofo grego Heráclito e de Jung.
   "Não faz muita diferença se examinamos os processos da natureza, exploramos antigas filosofias de vida, estudamos astrologia ou tentamos outras formas de introspecção,pois sempre deparamos com inúmeras leis fundamentais da vida. Na situação presente, a lei principal é que nada permanece em seu estado original. Heráclito já havia formulado, em tempos passados, a enantiodromia,que significa, de forma aproximada, tudo posteriormente se transforma em seu oposto. A esse respeito, Jung afirmou que tudo que é humano é relativo porque tudo se apoia em antíteses internas que são formas de energia. "'A energia se apoia necessariamente num contraste preexistente sem o qual nenhuma energia seria possível. (...) 
De inicio precisamos ter o alto e o baixo, o quente e o frio etc, antes que aquele processo de ajuste conhecido como energia possa ocorrer. Toda vida é energia e, por tanto, apoia-se na oposição . O objetivo não é transformar um valor em seu oposto, mas manter ambos os valores como são ao mesmo tempo em que se reconhece o contraste entre eles"'.
 (...) Se não existisse o '"ruim"', seria impossível apreciar o "'bom"' pois não haveria  oportunidade de se comparar os dois. "'Pois apenas pela intensidade da escuridão, os raios de luz podem se tornar visíveis em toda sua intensidade. A claridade e a escuridão compõem um dia e o bem e o mal constituem um ser humano.''' Jung também afirma,corretamente,que quando alguém mostra às pessoas seu lado escuro, elas sabem que ele deve ter um lado claro, e este, que está a par ao mesmo tempo de seus lados escuro e claro, enxerga-se de dois ângulos  a partir do meio. Percebe que a claridade e a escuridão se somam para constituir o mundo. Se alguém se identifica com apenas um dos opostos, o bom ou o ruim, a qualidade com a qual não se deseja ser identificado é evocada exatamente com a mesma força - se não na mente consciente , na inconsciente. Sempre que um indivíduo decide ser apenas bom, sua abordagem se torna unilateral. Não há nada de errado, naturalmente, com a '"bondade"' em si mesma, mas sendo severo, de maneira consciente, com seu comportamento, ele desperta uma força inconsciente - a maldade que se recusa conhecer  - e este fato, conforme é comum em tais casos de repressão, atua no sentido de compensar ou mesmo destruir aos poucos a maneira de ser conscientemente escolhida mas unilateral. Toda forma de dependência, seja ao álcool, morfina ou idealismo, provoca uma reação posterior. O bem e o mal formam um todo paradoxal O reconhecimento de ambos os opostos torna os conceitos de bem e mal relativos e esta relatividade é aplicável a todos os componentes da existência. Tudo possui dois lados e ambos os opostos estão presente ao mesmo tempo, embora um lado se mostre de maneira mais clara e portanto fique mais visível.
   A psique humana ( que é composta dos opostos "'conscientes'" e "'inconscientes'" ) luta, como tudo o mais na natureza, para atingir um equilíbrio e portanto é perfeitamente natural que uma grande ação numa parte da psique. Assim, por exemplo, grandes e positivas proezas intelectuais na consciência são com frequência seguidas por fortes reações emocionais de caráter negativo. A noção de enantiodromia - o fato de que tudo se transforma em seu lado oposto ou inverso - encontra em nossas vidas como no exemplo há pouco dado. Ambos os aspectos de uma única realidade se alternam continuamente. "'Assim no decorrer natural dos acontecimentos, efeitos positivos seguem efeitos negativos no inconsciente e vice-versa. Se a nossa fantasia produz uma imagem brilhante num momento, há uma imagem escura que se segue imediatamente após. Compete à nossa energia psíquica garantir a regulamentação mútua desses relacionamentos e mantê-los num estado de tensão viva. Pois todos esses pares de opostos devem ser ser considerados opostos não apenas em conteúdo mas também na intensidade de suas energias."'
   Relacionando este fato com a citação do Tao-te king (...), vemos que todo o princípio está contido nas palavras "'Dois geram três"'. A estrutura dos opostos (Dois) necessariamente põe em ação um terceiro fator (Três), ou seja, a energia que esses dois fatores se empenham em juntar. É essa energia (psíquica) que é assinalada na astrologia pelo conceito de quadruplicidade a as três quadruplicidades ilustram três direções distintas de escoamento desta complexa unidade de energia.
    Heráclito e Carl Jung não foram as únicas autoridades que abordaram o princípio de opostos - a ideia é importante sob muitas maneiras em muitas civilizações. Um excelente exemplo pode ser encontrado em um antigo pensamento chinês, trazido ao Ocidente por Richard Wihelm, onde é feita a tentativa de transpor os dois (aparentemente irreconciliáveis) pólos opostos na suposição que os opostos por fim se encontram. Pensa-se que duas condições, ainda que antagônicas, tornam-se compatíveis ao suceder uma à outra no decorrer do tempo, de tal forma que se transforma na outra. Esta é de fato a ideia básica do I Ching, o Livro das Mutações. O tempo é a chave para a oposição e a reconciliação."

                                                                          Do Livro Astropsicologia de Karen Hamaker -Zong/Ed. Nova Fronteira

 



segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Apolo: O deus da ilusão lúcida






   Numa revista mensal, acompanho uma coluna sobre mitos e sua jornada. Neste mês de Fevereiro,o tema é sobre o deus grego Apolo. Sempre tive uma imagem do deus como um ser sereno e intelectual, mas em se tratando de um mito grego, as coisas nem sempre são tão certas.
  Apolo, filho de Leto com o deus supremo do Olimpo Zeus. Em algumas traduções, Leto é considerada uma deusa muito diferente das demais, devido sua modéstia. Sempre gentil e afável e como toda deusa do Olimpo, muito bonita ao ponto de Zeus notar sua beleza.
   Como Zeus era o garanhão de todo Olimpo, um romance não tardou e logo Leto estava grávida. Um grande problema, visto que Zeus era infiel e tinha uma esposa mui ciumenta que sempre perseguia as amantes do marido, seu nome; Hera.
    Hera descobriu e lançou um decreto proibindo que as pessoas acolhessem ou ajudar a pobre Leto. A humilde deusa vagou durante nove meses sem que ninguém cedesse abrigo por medo de Hera. Finalmente, Leto encontrou um esconderijo na ilha de Delos, onde deu à luz a um casal de gêmeos, Apolo e Ártemi, deusa da caça.
   Apolo era o mais devotado a sua mãe embora não herdou o temperamento doce e gentil. Pelo contrário, revelou-se o mais vaidoso de todos os imortais. Um jovem temperamental e que nunca perdoava uma ofensa. Ganhara de Heféso,o armeiro dos deuses, um arco e flecha dourados enquanto sua irmã um feito de prata.
  Apolo foi atrás daqueles que negaram auxílio a sua mãe, alegando que receberam ordens de Hera,
matando-o um por um. Todos o gregos passaram então a temer suas flechas, tanto que lhe deram um apelido de "o deus que fere de longe". Quando alguém morria por um mal súbito ou uma doença misteriosa dizimava homens e animais, não havia dúvidas: o Filho de Leto estava por trás.
  Uma coisa o atormentava ainda mais: sua vaidade.Tinha necessidade de algo mais, mas não sabia exatamente o quê. Quem sabe algo que pudesse equilibrar esse seu lado assassino e vingativo. Buscou, nas profundezas do bosque, um arredio deus Pã, um hábil tocador de flauta. Bem diferente de Apolo, Pã não era um deus de grandes ambições. E de bom grado,ensinou tudo que sabia.
     O discípulo superou seu mestre, tornando-se o melhor harpista de todo o mundo antigo. Nos banquetes, esquecia toda sua ira constante dedilhando em sua lira, belas melodias.Mesmo assim, isso não coibiu sua tendência por ambições altas e logo bolava um plano para destronar Zeus do seu posto, já que se julgava o herdeiro natural. Tramou uma conspiração que falhou, Apolo foi punido. A princípio Zeus pretendia trancafiá-lo no Tártaro mas Leto intercede pelo filho. O supremo deus do Olimpo, decide por uma punição menos severa: servir como pastor durante um ano, nas terras de um mortal, o rei Admeto de Teare.
  Cuidando apenas das ovelhas, o rebelde deus passou seu tempo livre a refletir. Dessa reflexão aprendeu que até para um deus, há limites e que a grandeza em fronteiras, torna-se barbárie, loucura ou simples desperdício de energia. O próprio Zeus embora seja o rei dos deuses não era uma entidade suprema. Acima dele, estava Moira, a msiteriosa deusa do destino, envolvendo todas as coisas do universo e mais acima pairava o Caos, a única divindade ilimitada.
Por que devemos odiar nosso limites? Uma escultura só é bela devido ao limite imposto pelo escultor. Um ruído só se torna música por que ouve um acorde que molda os sons.

Luz no caos:

  A visão dos antigos gregos sobre a existência certamente influenciou os existencialistas. Temos um certo lado sombrio, pois mesmo que buscamos a harmonia o caos de vez enquanto dá sua face. Muitos espiritualistas nos dizem que há harmonia por traz do aparente caos. Talvez,ele seja necessário para a mudança e para própria evolução.
Apolo, notou isso, tanto, que após voltar de seu exílio cunhou duas frases célebres que nunca foram esquecidas, escritas na entrada do seu templo em Delfos: "Conheça-te a ti mesmo" e "Nada em excesso". Seu conselho, que mais tarde ficou conhecido pela pesquisa de Jung, é que não devemos ignorar nossas sombras, mas tão pouco deixar que elas nos dominem.
  O filósofo alemão, Friedrich Nietzsche chamou de espírito apolíneo, o impulso de desafiar o cosmos e impor-lhe alguma forma, com a força da imaginação. "Se pudéssemos imaginar uma encarnação da dissonância - e que outra coisa é o homem? - tal dissonância precisaria, a fim de poder viver, de uma ilusão magnífica que cobrisse com um véu de beleza sua própria essência", escreveu Nietzsche em O Nascimento da Tragédia. "Eis o verdadeiro desígnio artístico de Apolo: sob seu nome reunimos todas aquelas inumeráveis ilusões da bela aparência que, de algum modo, tornam a existência digna de ser vivida".
  Apolo é o deus da ilusão lúcida por isso que os artistas da antiguidade o amavam tanto. Embora portasse a lira, jamais abandonou o arco. "Há um fundo selvagem em toda harmonia humana; a beleza da vida terá sempre um vago gosto da morte;e,se hoje sou o deus da luz, é porque já olhei as trevas".

                                             Fonte: Revista Vida Simples-Ed.155/Fevereiro-Mitos e Jornadas por José Francisco Botelho