Numa revista mensal, acompanho uma coluna sobre mitos e sua jornada. Neste mês de Fevereiro,o tema é sobre o deus grego Apolo. Sempre tive uma imagem do deus como um ser sereno e intelectual, mas em se tratando de um mito grego, as coisas nem sempre são tão certas.
Apolo, filho de Leto com o deus supremo do Olimpo Zeus. Em algumas traduções, Leto é considerada uma deusa muito diferente das demais, devido sua modéstia. Sempre gentil e afável e como toda deusa do Olimpo, muito bonita ao ponto de Zeus notar sua beleza.
Como Zeus era o garanhão de todo Olimpo, um romance não tardou e logo Leto estava grávida. Um grande problema, visto que Zeus era infiel e tinha uma esposa mui ciumenta que sempre perseguia as amantes do marido, seu nome; Hera.
Hera descobriu e lançou um decreto proibindo que as pessoas acolhessem ou ajudar a pobre Leto. A humilde deusa vagou durante nove meses sem que ninguém cedesse abrigo por medo de Hera. Finalmente, Leto encontrou um esconderijo na ilha de Delos, onde deu à luz a um casal de gêmeos, Apolo e Ártemi, deusa da caça.
Apolo era o mais devotado a sua mãe embora não herdou o temperamento doce e gentil. Pelo contrário, revelou-se o mais vaidoso de todos os imortais. Um jovem temperamental e que nunca perdoava uma ofensa. Ganhara de Heféso,o armeiro dos deuses, um arco e flecha dourados enquanto sua irmã um feito de prata.
Apolo foi atrás daqueles que negaram auxílio a sua mãe, alegando que receberam ordens de Hera,
matando-o um por um. Todos o gregos passaram então a temer suas flechas, tanto que lhe deram um apelido de "o deus que fere de longe". Quando alguém morria por um mal súbito ou uma doença misteriosa dizimava homens e animais, não havia dúvidas: o Filho de Leto estava por trás.
Uma coisa o atormentava ainda mais: sua vaidade.Tinha necessidade de algo mais, mas não sabia exatamente o quê. Quem sabe algo que pudesse equilibrar esse seu lado assassino e vingativo. Buscou, nas profundezas do bosque, um arredio deus Pã, um hábil tocador de flauta. Bem diferente de Apolo, Pã não era um deus de grandes ambições. E de bom grado,ensinou tudo que sabia.
O discípulo superou seu mestre, tornando-se o melhor harpista de todo o mundo antigo. Nos banquetes, esquecia toda sua ira constante dedilhando em sua lira, belas melodias.Mesmo assim, isso não coibiu sua tendência por ambições altas e logo bolava um plano para destronar Zeus do seu posto, já que se julgava o herdeiro natural. Tramou uma conspiração que falhou, Apolo foi punido. A princípio Zeus pretendia trancafiá-lo no Tártaro mas Leto intercede pelo filho. O supremo deus do Olimpo, decide por uma punição menos severa: servir como pastor durante um ano, nas terras de um mortal, o rei Admeto de Teare.
Cuidando apenas das ovelhas, o rebelde deus passou seu tempo livre a refletir. Dessa reflexão aprendeu que até para um deus, há limites e que a grandeza em fronteiras, torna-se barbárie, loucura ou simples desperdício de energia. O próprio Zeus embora seja o rei dos deuses não era uma entidade suprema. Acima dele, estava Moira, a msiteriosa deusa do destino, envolvendo todas as coisas do universo e mais acima pairava o Caos, a única divindade ilimitada.
Por que devemos odiar nosso limites? Uma escultura só é bela devido ao limite imposto pelo escultor. Um ruído só se torna música por que ouve um acorde que molda os sons.
Luz no caos:
A visão dos antigos gregos sobre a existência certamente influenciou os existencialistas. Temos um certo lado sombrio, pois mesmo que buscamos a harmonia o caos de vez enquanto dá sua face. Muitos espiritualistas nos dizem que há harmonia por traz do aparente caos. Talvez,ele seja necessário para a mudança e para própria evolução.Apolo, notou isso, tanto, que após voltar de seu exílio cunhou duas frases célebres que nunca foram esquecidas, escritas na entrada do seu templo em Delfos: "Conheça-te a ti mesmo" e "Nada em excesso". Seu conselho, que mais tarde ficou conhecido pela pesquisa de Jung, é que não devemos ignorar nossas sombras, mas tão pouco deixar que elas nos dominem.
O filósofo alemão, Friedrich Nietzsche chamou de espírito apolíneo, o impulso de desafiar o cosmos e impor-lhe alguma forma, com a força da imaginação. "Se pudéssemos imaginar uma encarnação da dissonância - e que outra coisa é o homem? - tal dissonância precisaria, a fim de poder viver, de uma ilusão magnífica que cobrisse com um véu de beleza sua própria essência", escreveu Nietzsche em O Nascimento da Tragédia. "Eis o verdadeiro desígnio artístico de Apolo: sob seu nome reunimos todas aquelas inumeráveis ilusões da bela aparência que, de algum modo, tornam a existência digna de ser vivida".
Apolo é o deus da ilusão lúcida por isso que os artistas da antiguidade o amavam tanto. Embora portasse a lira, jamais abandonou o arco. "Há um fundo selvagem em toda harmonia humana; a beleza da vida terá sempre um vago gosto da morte;e,se hoje sou o deus da luz, é porque já olhei as trevas".
Fonte: Revista Vida Simples-Ed.155/Fevereiro-Mitos e Jornadas por José Francisco Botelho
Quem leu é gay
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